Meus pais se conheceram e se casaram ao final da segunda grande guerra mundial na Alemanha! Para o meu pai minha mãe era alguém que ele chegaria a ter como companheira e mãe para seus filhos! Alguém para conviver! Minha mãe culta e inteligente! Meu pai inculto, alguém que aprendera a ler e escrever na escola mas na escola não mais do que isso! Antiquado e inculto! Mas alguém sadio, vigoroso! E um bobalhão que não chega a compreender nada de coisa nenhuma, das coisas da vida também não! E um homem honrado, honesto, o que nenhum desses bilionários donos de meios de informação que eu tenho como inimigos chega a ser ou é, homem honrado, honesto!! E tendo como seu trabalho, seu meio de obter as coisas, sua profissão, a de sapateiro, que na lista de profissões que existia na época entre as garotas russas era a de menor status social! Para minha mãe uma coisa tipo "ou dona de casa , ou puta, ou te mata, escolhe". Viver para os filhos!
Minha mãe gerou os filhos do meu pai em dela, cozinhava, lavava a louça, lavava a roupa e a passava e mantinha a casa em que viviam higienizada! Na casa que o meu pai construiu no terreno que comprou no alto do morro, com o fruto do seu trabalho, minha mãe fez um canteiro de margaridas e plantou ali um pessegueiro, um pé de laranja, um pé de uva moscatel, um pé de limão e um pé de maçã, um pé ameixa e um pé de goiaba, e havia ainda alguns cinamomos e um pé de uva do Japão e o esterco de vaca trazido em carrinho de mão da casa do Seu Olinto que tinha algumas vacas das quais sua esposa cuidava! Seu Olinto era padeiro!
E minha mãe quis também ajudar nas despesas, trabalhar, fazer alguma coisa que lhe rendesse algum dinheiro! Meu pai lhe comprou uma máquina de costura! Minha mãe ia até o centro da cidade buscar rolos de tecido para costurar, para uma empresa que havia na cidade mas numa dessas idas e vindas encontrou as crianças brincando com fósforos e desistiu da costura em razão disso! Uma senhora que vivia em um beco ao pé do morro , a beira do Guaíba, e que era romena e que tinha em sua casa de madeira um piano lhe sugeriu abrir um comércio, uma tendinha, comprar coisas no centro da cidade e as revender no morro para as pessoas que ali viviam! E minha mãe pediu para meu pai construir uma tendinha para ela e meu pai comprou umas tábuas e fez para ela uma tendinha! E a tendinha prosperou, foi em frente! Minha mãe ia a cidade e de lá trazia sacolas e mais sacolas! Ficou bem sortida a tendinha! Uma geladeira foi comprada! Minha mãe tentou fazer nela sorvete para vender na tendinha mas o sorvete não ficou bom! Algumas coisas dessa fase que ela contava e que eu ainda lembro: de uma vez que ela chorou porque um homem pediu para ela vinho e mais alguma coisa e na hora de pagar, vem comigo para o matinho, vem, que eu te pago! Uma parte das pessoas que aqui viviam, a mais pobre, era gente que tinha vindo campo, na época da colheita do arroz vinham caminhões buscá-los para trabalhar na colheita! Dizia que algumas vezes quando subia o morro carregando suas sacolas ouvia,, de mulheres, empiriquitadas, esperando seus maridos voltarem do trabalho, para que o esforço? vai levar para o túmulo quando morrer?!!!!
E a tendinha se transformou em um armazém e o trabalho da minha mãe no armazém bem mais rentável que o trabalho do meu pai na sapataria dele! Meu pai abandonou a sapataria que tinha ao pé do morro e passou a ajudar no armazém o que talvez não deveria ter feito! Era alcoólatra, e as pessoas implicavam com ele, com seu jeito próprio de falar, o que lhe vinha a mente em seu português errado e era lento e não era muito bom em escrever e calcular e isso como sendo gatilhos que o levavam ao álcool, e a mulher com uma capacidade de trabalho maior e inteligência maior do que a dele e ciumento e caseiro, de querer ficar na casa dele com os seus, e a minha mãe mais sociável de gostar de ficar entre as outras pessoas, de se reunir de vez em quando com pessoas que ela tinha como seus amigos! O que não vem ao caso!
Em suma, o armazém que minha mãe construiu era um empreendimento bem modesto, mas honesto, honrado de gente honesta e honrada o que a empresa de bilionária que se instalou ao lado da minha casa não é, não chega a ser ! Não é nem uma empresa jornalística honrada, honesta e nem propriedade de gente honesta, honrada!